A conquista do voto feminino favoreceu somente a elite branca que se prioriza enquanto dominante
A conquista do voto feminino brasileiro completa hoje 90 anos de existência em meio a uma série de violências políticas cometidas às mulheres. Em recente conversa com a RMN-PR, na live Mulheres negras em foco: Conjuntura do Movimento de Mulheres Negras, Lúcia Xavier, coordenadora geral da ONG Criola, destacou duas estratégias importantes: “o fortalecimento da ação política dessas mulheres, passa pelo nosso envolvimento no debate sobre direitos, sobre política e com elas nos ajudando a pensar essas saídas, mas também protegendo-as, porque quando elas passam para o outro lado, passam a ser ofendidas, humilhadas e perseguidas”.
O atual número do eleitorado feminino brasileiro é de 52,50%, porém como representantes políticas temos somente 15% na Câmara dos Deputados e 12,4% no Senado. Este percentual não chega a 3% para cargos ocupados por mulheres negras, os dados são do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O Brasil é o 142º no ranking mundial de participação de mulheres na política nacional.
Mesmo ocupando 45,30% das filiações partidárias no país, as mulheres não são consideradas/ indicadas como líderes de partido, muito menos como representantes de chapa ou de intenção de votos. Em 2016 o Brasil foi impactado pelo impeachment de Dilma Rousseff, o segundo da história nacional, dado a primeira mulher eleita como presidente do país.
É inevitável o questionamento diante dos números: se somos maioria, por que as mulheres, sobretudo as mulheres negras, têm tão pouca representatividade? Considerando o processo de abolição da escravatura no Brasil pode-se entender melhor o porquê desta estrutura política ainda surtir efeito mesmo 90 anos depois. E a resposta está no machismo e racismo institucional do país.
O acesso ao voto da mulher negra foi muito difícil, pois para poder votar em 1932, as mulheres tinham de cumprir exigências que restringiam as potenciais eleitoras. Era necessário que as mulheres casadas pedissem permissão aos maridos. As viúvas tinham de comprovar trabalho e renda fixa, as solteiras precisavam estar em funções públicas com idade mínima de 21 anos - mais tarde passou para 18 anos -, sem contar que pessoas analfabetas ficaram sem o direito ao voto até o ano de 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal.
Como seria possível uma mulher negra, naquele contexto, sem acesso à educação, ter condições financeiras para ser casada oficialmente e ainda declarar bens? A conquista do voto feminino favoreceu somente a elite branca que se prioriza enquanto dominante e precariza o sistema desestimulando o avanço das populações mais vulneráveis.
Em 1989, em análise da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/89), o perfil do eleitorado brasileiro em relação a posse de título eleitoral, naquele contexto, era de apenas 5,4% da população preta e de 35% da população parda em contraponto com a população branca que era de 59%. A posse do título de eleitor estava vinculada à raça e classe, pois um povo segue marginalizado se não há interesse político em acabar com as desigualdades.
A falta de representatividade está em ser a principal vítima do Estado. A mulher negra luta para sobreviver, pois de acordo com o Altas da Violência de 2019, 66% de todas as mulheres assassinadas no país eram negras. Além disso, segundo a Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE, 63% dos lares chefiados por mulheres negras estão abaixo da linha da pobreza.
A existência da mulher negra é um ato político. E ela ocupar espaços de poder assegura não só a democracia como a justiça social. Para Lúcia Xavier, as mulheres negras que atuam no meio político “têm muita coragem. Muita coragem para nos defender, nos apoiar, acreditar que estão no caminho certo. Muita coragem para enfrentar aquele mundo complexo que são os parlamentos”. Não vote em branco, vote na preta!
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